Inauguração de ‘Plant Revolution!’ este sábado no Centro Internacional das Artes José de Guimarães
CIAJG dedicou o ano a ‘Resgatar a Diversidade’, culminando agora com uma grande exposição coletiva que confronta arte com pensamento, ciência, imaginação e sustentabilidade, à qual se juntam duas novas mostras e um ciclo de conferências.
As portas do Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG) abrem-se este sábado, 19 de outubro, pelas 21h30, para revelar um universo vegetal que nos porá a pensar a relação do humano com as plantas, explorando diferentes narrativas de mediação tecnológica do reino vegetal. ‘Plant Revolution!’ – a grande exposição coletiva que agora inaugura com curadoria de Margarida Mendes – reflete sobre o encontro interespécies, perguntando o que acontecerá quando dissolvermos as fronteiras entre o parasita e o hospedeiro. Acreditando na continuidade entre seres e o ambiente, esta exposição incluirá trabalhos que exploram formas de recuperação política, estimulando um imaginário emancipatório e lançando novos vocabulários para pensar o planeta, para além da divisão do mundo natural.
O programa da inauguração, com entrada livre, inicia-se às 17h00 de sábado com a conferência ‘A Planta Mediada’, de Teresa Castro, e prolonga-se até à manhã de domingo com a ‘Assembleia’ em formato performance, às 12h00. A par de ‘Plant Revolution!’, juntam-se no CIAJG duas mostras com curadoria de Nuno Faria: ‘José de Guimarães – Pintura e Desenho do período angolano’ e ‘Júlio Fernandes da Silva – a página tantas, desenho’, sendo igualmente possível visitar a exposição ‘Geometria Sónica’ até fevereiro do próximo ano, para além da coleção permanente.
O ano que o CIAJG dedicou a ‘Resgatar a Diversidade’ vem-se desenvolvendo de forma múltipla e heterogénea, integrando temas, conceitos, preocupações e visões do futuro. É hoje óbvio, embora paradoxal, que mais do que em nenhuma outra época da existência humana nos sentimos frágeis e desprotegidos perante as forças extra-humanas que nos envolvem e que desde o advento do antropocentrismo desconsiderámos e secundarizámos. É em torno dessas forças que gravitam as exposições que estão atualmente patentes e que agora vão inaugurar – o mundo vegetal, natural, é tematizado, e mais do que isso, imaginado, de múltiplas maneiras: em modo poético ou político, a partir da ciência ou da ficção, como angústia individual ou consciência de uma era comunitária por vir.
A programação de 2019 do CIAJG culmina com uma grande exposição coletiva, voltando a pôr em evidência questões ecológicas e de sustentabilidade com ’Plant Revolution!’. Num futuro não muito distante, as plantas dominarão o planeta tornando-o num Universo vegetal. Estes seres sencientes sobreviverão resilientes às transformações planetárias, disseminando as suas raízes por toda a crosta terrestre como um grande organismo que prolifera em múltiplas dimensões. O que pensarão estas plantas quando olharem para trás e refletirem sobre a forma como nos relacionávamos com elas? E o que poderemos nós agora aprender com as plantas neste momento de crise planetária?
O estudo das plantas como infraestrutura tem suscitado interesse entre a comunidade científica ao longo dos últimos séculos, inspirando gerações de investigadores, bem como o desenvolvimento de tecnocosmologias e sistemas cibernéticos. Profundamente influenciadas pelo conhecimento das plantas sagradas, gerações de tecno-utopistas na Califórnia têm vindo a debater a senciência das mesmas, demonstrando grande curiosidade pela cognição expandida das plantas e estimulando o aparecimento de áreas como a biomimética. Por outro lado, a subalternização das plantas pela indústria alimentar e pela geoengenharia tem criado divergências genéticas que afetam a sua fertilidade, gerando uma condição de dominação militarizada e desigual. Como resposta, têm surgido comunidades resilientes por todo o mundo baseadas em filosofias indígenas e no pensamento agroecológico, criando espaços de resistência que visam à coabitação equitativa.
Esta exposição com curadoria de Margarida Mendes – que ocupará as salas #6, #9 e #11 do CIAJG – conta com a participação de Agência, Alexandre Estrela, Comunidade De Artesãs Mujeres De La Resistencia EZLN, Diogo Evangelista, Filipa César, Inhabitants, Joachim Koester, Joana Escoval, Knowbotiq, Maria Thereza Alves, Paulo Tavares, Pedro Neves Marques, Peter Zin, Regina De Miguel, Richard Lowenberg, Suzanne Treister, Terence Mckenna, Teresa Castro, e textos de Amin Ahmet Mutawa, Erik Davis e Fernando Garcia Dory.
O programa de inauguração de ‘Plant Revolution!’ leva-nos até à manhã do dia seguinte, momento em que o CIAJG e o seu público testemunharão mais um evento inédito com a ‘Assembleia’ que debaterá Thing 000777 (Da Vine), uma controvérsia acerca de uma patente de ayahuasca entre o Centro Internacional de Lei Ambiental (CIEL), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazónia Brasileira (COICA), a Coligação do Povo Amazónico e seu Ambiente, e o Departamento de Patentes e Marcas Comerciais dos E.U.A. (USPTO). Para iniciar o debate do caso estará presente um grupo de especialistas, incluindo o fitoterapeuta e curandeiro Alberto Suarez Chang, a ecologista Joana Rafael, a psicóloga Maria Carmo Carvalho, a antropóloga Rita Natálio, entre outros. O evento decorrerá em inglês e tem início previsto para as 12h00.
A sustentabilidade estará também em foco no último ciclo de conferências deste ano, inaugurado a 26 de setembro por Nuno Faria com uma reflexão acerca do último ano de trabalho do Centro, em torno do mote ‘Resgatar a Diversidade’. A 19 de outubro, às 17h00, a convidada das conferências do CIAJG é a artista e investigadora Teresa Castro, que se tem dedicado a estudar o movimento das plantas e que vai desenvolver o seu pensamento a partir da exposição ‘Plant Revolution!’ levantando questões como “Será a planta inteligente uma planta necessariamente mediada pela técnica - e em particular pelas tecnologias visuais? Poderá a técnica convidar-nos a repensar o nosso lugar no mundo e a relação com as plantas?”. A 21 de novembro, às 18h00, a última conferência deste ciclo reúne a curadora Mariana Pestana, Francisco Adão da Fonseca e Pedro Jervell (SKREI – Oficina de Arquitetura Integrada) com Nuno Faria em torno do o projeto Eco-Visionários: Arte, Arquitetura e Novos Media após o Antropoceno (apresentado no final do ano passado, no MAAT), aprofundando a reflexão em torno da diversidade e da sustentabilidade, que estiveram no centro das preocupações ao longo de todo o ano.
Esta é também uma ocasião para conhecer as novas mostras ‘José de Guimarães – Pintura e Desenho do período angolano’ e ’Júlio Fernandes da Silva – a página tantas, desenho’. A primeira, patente nas salas #2 e #8, remete para o período africano de José de Guimarães, que ocorre entre 1967 e 1974, um dos mais singulares e surpreendentes dentre os percursos autorais da arte portuguesa da segunda metade do século XX por razões estéticas, sociológicas, antropológicas e políticas, mas, sobretudo, pela singularidade do contexto histórico e pela condição de dupla identidade que é a de José de Guimarães naqueles anos. Os cruzamentos disciplinares que o próprio realiza durante estes anos tecem uma trama complexa e impura, marcada pelo experimentalismo e por uma radical abertura à alteridade e são guiados por uma notável intuição visual, plástica e linguística que leva o artista a realizar uma síntese de grande originalidade entre códigos de representação próprios de culturas tão distantes quanto a europeia e a africana, sistemas de escrita tão estranhas uma à outra quanto a alfabética e a ideográfica.
Por sua vez, a sala #5 do CIAJG acolhe a mostra de Júlio Fernandes da Silva. O conjunto de desenhos apresentado é simbólico das duas áreas de interesse e de investigação que estruturam o seu percurso enquanto artista – a escrita e a imagem. São, maioritariamente, desenhos de pequenas dimensões, realizados com grande minúcia a tinta sobre papel preparado, cuja aparência os aproxima do pergaminho. De facto, os desenhos que irá expor pertencem a uma linhagem gráfica, poética e visionária de remotas origens que aproxima, em método e em espírito, os iluminadores da época Medieval, os calígrafos do Extremo-Oriente ou autores modernos como Henri Michaux ou Victor Hugo, exemplos maiores da contaminação entre pintura e escrita, imagem e palavra. Parecem registar as infinitas modulações do fluxo da perceção em múltiplas configurações gráficas que remetem para o imaginário do mundo vegetal, algures entre a mimesis e a metamorfose. Júlio Fernandes da Silva estudou pintura no Ar.Co, escola de arte independente sediada em Lisboa, no começo da década de 1990. Tem vindo a expor regularmente o seu trabalho quer em Portugal, quer na Noruega, país onde vive há mais de duas décadas. É atualmente diretor do Instituto de Arte Interdisciplinar (Det Tverrfaglige Kunstinstitutt), uma escola de arte localizada em Fornebu, nos arredores de Oslo.
De lembrar que a exposição ’Geometria Sónica’ permanecerá patente até 16 de fevereiro de 2020 nas salas #12 e #13 no Centro. O projeto reúne um extenso conjunto de artistas portugueses e estrangeiros que trabalharam a partir do contexto institucional do Arquipélago - Centro de Artes Contemporâneas em diferentes plataformas físicas e concetuais e cujas obras e pesquisas incorporam o som, como material, ou como estrutura concetual.