As árvores

Liriodendron tulipifera (Tulipeiro-da-virgínia) – Mosteiro de Santa Marinha da Costa, Guimarães
Há uns anos deparei-me com um artigo, em que durante a sua leitura, uma frase marcou-me: “Portugal odeia as árvores”. Infelizmente, não me recordo onde o li, nem quem o escreveu, mas a verdade é que esta afirmação permanece comigo até hoje.
Mas porque é que os portugueses odeiam tanto as árvores?
Estamos perante anos de «iliteracia arbórea». Quem não as entende, realiza podas drásticas que prejudicam gravemente a sua saúde, outros têm medo delas e defendem que devem ser abatidas. Há também quem se incomode com as folhas durante o outono, afirmando que as ruas ficam sujas…
Pergunto-me o que será necessário para que a população entenda que as árvores são fundamentais à existência humana.
Quando é que nos esquecemos da nossa ligação à natureza? Estamos tão desconetados da nossa ancestralidade e das nossas raízes, que acabamos por esquecer a nossa história?
É preciso desmistificar estes seres vivos. Partilhar os seus segredos e benefícios, tanto ambientais, sociais e económicos.
Então, porque é que as árvores são fundamentais à existência humana?
1º Melhoram a qualidade do ar e absorvem o dióxido de carbono da atmosfera: A média de emissão de dióxido de carbono por habitante em Portugal, é de 5.2 toneladas por ano (dados do Instituto Nacional de Estatística). Guimarães, tem cerca de 4000 árvores na zona urbana (UF de Oliveira S. Paio e S. Sebastião), que captam aproximadamente 112 toneladas de dióxido de carbono por ano. Na zona urbana vivem 7830 pessoas. Através de um cálculo rápido é possível perceber que estas árvores estão longe de conseguir compensar a emissão de todos os habitantes.
2º Pela sua sombra: A sombra beneficia a saúde pública e eficiência energética dos edifícios. Diminuem ainda o efeito das ilhas de calor, reduzindo a temperatura e aumentando o conforto térmico dos espaços urbanos.
3º Controlam cheias e inundações: As árvores têm uma grande capacidade de retenção de água, sendo uma das maiores aliadas no combate às cheias e inundações em espaço urbano (que na maioria das vezes é bastante impermeabilizado).
4º Diminuem a poluição sonora: Funcionam como barreiras sonoras, que atenuam o ruído causado pelo tráfego automóvel.
5º As folhas não são lixo: As folhas são matéria orgânica que enriquecem os solos e servem de alimento para diversos organismos. Devem ser deixadas junto ao colo da árvore, para que o solo se mantenha fértil, auxiliando no seu bom estado fitossanitário.
6º Não caem só porque está vento: Existem árvores com centenas de anos, que permanece imóveis, suportando tempestades e ventos fortes. A sua estrutura oscila com o vento, estando totalmente adaptadas a condições adversas.
7º Aumentam a biodiversidade urbana: Criam excelentes corredores ecológicos, que atraem diversas espécies de aves, insetos e mamíferos.
8º Valorização estética: Áreas verdes bem cuidadas, acabam por beneficiar economicamente as áreas urbanas, seja através do aumento do valor de imóveis, ou de compra no comércio local.
9º São medicinais: Para quem gosta de terapias holísticas, abraçar árvores pode ser uma das medicinas naturais para o combate à ansiedade e stress, melhorando a saúde mental de quem lida com elas diariamente.
10º Produzem oxigénio: Sem oxigénio não sobrevivemos.
Guimarães tem percorrido um longo caminho no que diz respeito à proteção do património arbóreo, por isso é que quem nos visita fica fascinado com o verde que se expande através do centro histórico, conectando-se a todas as freguesias do concelho. A chamada infraestrutura verde.
De norte a sul, de este a oeste, Guimarães é verde. E este património natural, fruto de anos de cuidado e crescimento, tem de ser protegido e respeitado. Por homenagem a quem as plantou e nunca usufruiu da sua sombra, por nós e pelas gerações futuras.
É inevitável que árvores possam cair. Até elas precisam de morrer. Até elas precisam dar lugar a outros exemplares. São seres vivos, respiram como os humanos, ficam doentes e também morrem. Fazem parte da natureza. E a natureza é feita de ciclos. Primavera, verão, outono, inverno. Nascimento, vida, morte. Vezes e vezes sem conta. Conceitos tão simples que todos aprendemos na escola e ainda assim, esquecemos.
O importante é evitar que acidentes ocorram em espaço urbano. O importante é avaliar o arvoredo urbano e reeducar os cidadãos sobre as árvores. O importante é desenhar e orientar o planeamento de espaços verdes, selecionar cuidadosamente as espécies que devem ser plantadas, analisar e observar o seu comportamento, e fiscalizar regularmente os elementos arbóreos que possam estar em risco.
É esse o trabalho que temos vindo a desenvolver no Laboratório da Paisagem. Seja através do Gabinete de Paisagem e Território ou do Gabinete de Gestão de Arvoredo. Todos os dias trabalhamos para que cada vez mais, a população viva em harmonia com as árvores.
Por isso, posso dizê-lo com certeza que Guimarães não odeia as árvores.
Guimarães privilegia, entende e respeita o seu património arbóreo.
“As árvores crescem sós. E a sós florescem.
Começam por ser nada. Pouco a pouco
se levantam do chão, se alteiam palmo a palmo.
Crescendo deitam ramos, e os ramos outros ramos,
e deles nascem folhas, e as folhas multiplicam-se.
Depois, por entre as folhas, vão-se esboçando as flores,
e então crescem as flores, e as flores produzem frutos,
e os frutos dão sementes,
e as sementes preparam novas árvores.
E tudo sempre a sós, a sós consigo mesmas.
Sem verem, sem ouvirem, sem falarem.
Sós.
De dia e de noite.
Sempre sós. (…)”
António Gedeão
Arquiteta Sara Terroso
Coordenadora de Projetos do Laboratório da Paisagem