JURISPRUDÊNCIA

Ao nível da contratação pública, destacamos os seguintes acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo:
Contencioso pré-contratual. Plano de trabalhos. Avaliação das propostas. Fundamentação.
Acórdão n.º 01742/23.8BEPRT de 24 de outubro de 2024
Sumário:
I - Apurando-se que o Plano de Trabalhos, o Plano de Mão de Obra e o Plano de Equipamentos, para além dos demais documentos obrigatórios, foram apresentados pelas Contrainteressadas, não está em causa a falta de apresentação de qualquer documento obrigatório, por todos os documentos terem sido apresentados, antes o seu respetivo grau de concretização ou de explicitação quanto a certas matérias.
II - Tal como definido pela entidade adjudicante, o grau de detalhe e completude do Plano de Trabalhos, relativos ao modo de execução dos trabalhos, assim como dos restantes Planos de Mão de Obra e de Equipamentos, integram o modelo de avaliação das propostas, segundo os diversos fatores e subfatores e respetivos parâmetros de avaliação, por as classificações parciais e total a atribuir a cada proposta dependerem desse grau de concretização.
III - Pelo que, quanto a saber se o teor dos documentos apresentados respeitam as vinculações legais e administrativas aplicáveis e quanto à respetiva qualificação das exigências previstas nas peças do procedimento, como definido no Programa de concurso, estão em causa aspetos de execução do contrato a celebrar que não se traduzem em termos ou condições não submetidos à concorrência, mas antes em atributos da proposta, que dependem do que cada concorrente tiver proposto na respetiva proposta apresentada, por desse modo ter sido construído todo o sistema de avaliação das propostas.
IV - No respeitante aos aspetos que devam integrar o Plano de Trabalhos, tal como discriminados nos vários números do n.º 6 do artigo 11.º do Programa do Concurso, não estão em causa aspetos da proposta que, no caso de serem omissos ou insuficientemente concretizados, se possam reconduzir a motivo de exclusão da proposta, mas antes a situações que implicarão uma sua menor avaliação, com a atribuição de pontuações mais baixas.
V - Nem a lei, nem as peças do procedimento cominam com a exclusão a proposta que não seja suficientemente concretizada quanto às suas especificações, por, diferentemente, resultar do sistema de avaliação das propostas a diferente avaliação consoante o grau de concretização dos diversos Planos apresentados.
VI - A mera insuficiência ou incompletude do Plano de Trabalhos apresentado com a proposta para a realização de uma empreitada de obras públicas, não viola o n.º 1 do artigo 361.º do CCP e não constitui um fundamento de exclusão da proposta, quando aquele Plano corresponda a um aspeto da execução do contrato submetido à concorrência, como no presente caso.
VII - Embora estejam em causa documentos distintos, todos os Planos previstos nas peças do procedimento, Plano de Trabalhos, Plano de Mão-de-Obra e Plano de Equipamentos, são complementares e integrativos da manifestação da vontade da concorrente, devendo ser analisados de modo relacional e globalmente, segundo a unidade jurídica que constitui a proposta do concorrente.
VIII - O Tribunal apenas se pode substituir à Administração em matéria de avaliação de candidatos ou de propostas, em caso de erro grosseiro, notório ou evidente de avaliação, o qual, no presente caso, nem sequer vem invocado.
IX - A fundamentação da avaliação das propostas decorre da densidade do modelo de avaliação, ao permitir extrair as respetivas classificações parcelares e totais atribuídas a cada proposta, segundo os parâmetros previamente fixados.
X - A respetiva grelha de fundamentação, nos termos definidos pela entidade adjudicante nas peças do procedimento, consubstancia essa mesma fundamentação, revelando as razões da classificação atribuída.
Contencioso pré-contratual. Suprimentos. Irregularidade.
Acórdão n.º 01181/23.0BEPRT de 24 de outubro de 2024
Sumário:
I - Nos termos do art. 72º, 3 do CCP, na redacção introduzida pelo Dec. Lei 78/2022, de 7 de Novembro, o júri deve solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento de irregularidades formais das suas candidaturas e propostas que careçam de ser supridas, desde que tal suprimento não seja susceptível de modificar o respectivo conteúdo e não desrespeite os princípios da igualdade de tratamento e da concorrência, designadamente, nos casos exemplificativamente previstos nas alíneas a), b) e c).
II - Na interpretação deste preceito legal devemos entender que as situações exemplificadas pelo legislador nas alíneas a), b) e c) configuram situações que reúnem os atributos gerais enunciados no corpo do artigo e, portanto, estamos perante irregularidades formais, que não modificam o conteúdo da proposta, nem os princípios da igualdade e da concorrência.
III – Nos termos do art. 72º, 3, al. a) deve ser suprida a irregularidade respeitante “A não apresentação ou a incorreta apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da candidatura ou da proposta…”
IV – Cabe na previsão do art. 73º, 3, alínea a) um documento apresentado pela concorrente em que assumia capacidade de fornecimento de peças de substituição, quando o Programa do Concurso exigia um documento que comprovasse aquela capacidade.
Exclusão de propostas. Erro. Proposta
Acórdão n.º 0875/23.5BEPRT de 17 de outubro de 2024
Sumário:
As correcções de lapsos ou erros nas propostas, ao abrigo do art. 249.º do CC, pressupõem que o lapso ou o erro se manifeste com objectividade, de modo que apenas se rectifica a forma, e não a substância, não sendo este regime aplicável aos casos de erros materiais da proposta.
Fixação. Especificações Técnicas.
Acórdão n.º 04439/23.5BELSB de 17 de outubro de 2024
Sumário:
I - Quando esteja em causa a aquisição de bens que envolva a fixação de especificações técnicas, a entidade adjudicante, ao lançar o concurso, pode socorrer-se de uma de três modalidades: i) utilizar termos de desempenho ou de requisitos funcionais; ii) definir especificações técnicas; ou iii) remeter para normação técnica.
II - As formulações de acordo com a alínea a) ou de acordo com a alínea b) do n.º 7 do artigo 49.º do CCP, constituem possibilidades ao alcance das entidades adjudicantes, sem prioridade entre si.
III - E a redação do artigo 42.º, n.º 3, da Diretiva 2014/24 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos (e que revoga a Diretiva 2004/18/CE) não estabelece uma hierarquia entre os métodos de definição de especificações técnicas, nem concede qualquer preferência a um desses métodos.
IV - Em sede de recurso de revista per saltum está vedado ao Supremo Tribunal Administrativo pronunciar-se sobre a matéria de facto (art. 151.º, n.º 1, do CPTA).
V - Existindo deficit instrutório que impossibilita o conhecimento da ampliação do objeto do recurso, o princípio da tutela jurisdicional efetiva e o direito constitucional a um processo equitativo (art. 20.º, n.º 4, da CRP), impõem a baixa dos autos ao TCA Sul para efeitos da pertinente instrução e prova nesse âmbito, em ordem ao conhecimento do mérito da apelação.
VI - O princípio pro actione é um corolário normativo ou uma concretização do princípio constitucional do acesso efetivo à Justiça, que aponta para uma interpretação e aplicação das normas processuais no sentido de favorecer o acesso ao tribunal ou de evitar as situações de denegação de justiça, designadamente por excesso de formalismo.