Jurisprudência

Ao nível da contratação pública, destacamos os seguintes acórdãos proferidos pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 21 de março de 2025, a saber:
Contencioso pré-contratual. Declaração de conformidade CE.
Sumário:
I – As directivas da EU não são, em princípio, directamente aplicáveis às relações jurídicas intersubjectivas, nem aos factos jurídicos concretos. Tanto basta para que não esteja desconforme com a Decisão nº 768/2008CE Parlamento Europeu e do Conselho de 9 Julho de 2008, designadamente com o ponto 5 do “Modelo” preconizado no seu anexo III, interpretado no sentido de exigir a indicação da “legislação comunitária aplicável em matéria de harmonização”, o documento intitulado “Declaração de Conformidade”, integrante da proposta das CIs, em que se declara que o equipamento utilizar e fornecer está em conformidade com as normas harmonizadas e se indica estas, mas não se identifica quaisquer directivas europeias relativas ao equipamento.
II - A frase “O objecto da declaração acima mencionada está em conformidade com a legislação comunitária aplicável em matéria de harmonização”, que constitui o parágrafo 5 do Modelo de declaração CE de Conformidade não carece de qualquer complemento, a acrescentar pelo operador económico, não só para ter pleno e conclusivo significado, como também por bastar para assegurar os fins que a declaração prossegue, segundo a Decisão 768/2008/CE, pelo que, se é certo que a pontuação que a remata e a linha pontuada que se lhe segue, fazem supor a possibilidade de se seguir algum preenchimento, daí não se segue a necessidade/obrigatoriedade do mesmo.
III - Consequentemente, não era devida a exclusão da proposta das CIs, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 70º do CCP, por a “Declaração de Conformidade” da proposta das CIs não poder valer como a “declaração de Conformidade CE dos equipamentos” exigida pela alª e) do n.° 1 do artigo 10.° do Programa de Procedimento.
IV – Mesmo que se entenda que, atento o sobredito Modelo de Declaração CE de Conformidade, havia que indicar a “legislação comunitária aplicável em matéria de harmonização”, a omissão desta menção não podia ser determinante da exclusão da proposta nos temos da alª a) do nº 1 do artigo 70º do CCP, por consistir, in casu, na preterição de uma formalidade suprível e suprida pela análise dos documentos, já que a indicação das normas harmonizadas, permitindo identificar, indutivamente, qualquer legislação aplicável em matéria de harmonização, provia à teleologia da “declaração de conformidade CE” ilustrada no teor da Decisão 768/2008CE e dos seus considerandos.
V - Cumpre distinguir entre o certificado e o seu objecto, sendo certo que a data de um certificado não prejudica, antes implica, que o seu objecto lhe pré-exista. Assim sendo, saber se o tribunal a quo errou, ou não, ao considerar, em ordem à improcedência da sobredita alegação das Autoras e ora recorrentes, que os documentos (os certificados) apresentados num outro procedimento eram irrelevantes para o procedimento sub juditio, é questão inútil para a crítica do julgamento sob recurso.
Contencioso pré-contratual. Artigo 49.º, n.º 2, alínea a) do CCP. Menção “ou equivalente”. Princípio da boa-fé e da confiança.
Sumário:
I- O artigo 49º, n.º 2, alínea a) do CCP, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, estabelecia expressamente que as especificações técnicas devem ser fixadas por referência a normas nacionais que transponham normas europeias, homologações técnicas europeias, especificações técnicas comuns, normas internacionais ou outros sistemas técnicos de referência estabelecidos pelos organismos europeus de normalização, "devendo cada referência ser acompanhada da menção “ou equivalente”.
II- A ratio legis deste preceito é clara e inequívoca: garantir que os procedimentos de contratação pública não sejam restritivos da concorrência, assegurando a todos os operadores económicos a possibilidade de apresentar soluções técnicas equivalentes às expressamente referidas no caderno de encargos.
III- Não oferecendo controvérsia que o Caderno de Encargos fazia referência à norma EN 840 e à marca RAL GZ 951/1, contudo, sem mencionar a possibilidade de apresentação de soluções equivalentes, deve entender-se que tal omissão viola o disposto no artigo 49.º, n.º 2, alínea a), do Código dos Contratos Públicos, independentemente do grau de conhecimento ou disseminação destas normas no mercado relevante.
IV- Não se pode obter, por via da proteção que é conferida pelos princípios da boa-fé, da justiça e da proteção da confiança, uma solução para uma situação jurídica ilegal.