Projeto COMvivência(s): O Teatro como Arte dos Encontros (Improváveis)
Qual é a probabilidade de reunir, num mesmo palco, moradores de habitação social municipal de Guimarães, estudantes de Medicina da Universidade do Minho e utentes do projeto Portas Abertas da Cruz Vermelha?
À primeira vista, seria um encontro improvável. Mas desde janeiro de 2025 essa confluência de mundos tem acontecido de forma real e transformadora, no âmbito do projeto COMvivência(s), promovido pela Associação Paisagem Periférica.
Inspirado pelo mote do CUIDAR — de nós, dos outros, do ambiente e da comunidade — o projeto propõe estimular a prática do cuidado através do teatro e de diversas ações de convivência artística. Através de oficinas, encontros e experiências partilhadas, o COMvivência(s) transforma o ato de cuidar em gesto criativo e coletivo.
Entre as iniciativas, destacam-se a Oficina de Teatro de Moradores, as Consultas Poéticas— encontros individuais com um artista que culminam numa “prescrição” poética (um poema, uma dança ou uma música) — e várias oficinas colaborativas. Nesses espaços, os participantes exploram a empatia, o autocuidado e o olhar atento sobre o outro, num processo que une arte, saúde e comunidade.
Para os moradores das habitações sociais geridas pela CASFIG, a experiência tem fortalecido a autoestima, o bem-estar e o sentimento de pertença. Já para os estudantes de Medicina, o projeto constitui uma oportunidade única de repensar o conceito de saúde, reconhecendo no teatro uma prática capaz de desenvolver competências essenciais de comunicação, escuta e interação humana — dimensões fundamentais para o exercício de uma medicina mais empática e consciente.
O ponto alto do projeto foi o espetáculo “Cuidar”, apresentado no auditório da Universidade do Minho, que reuniu em palco moradores e estudantes de Medicina. Este exercício teatral, talvez o mais desafiante de conceber e concretizar, materializou o espírito do COMvivência(s): através do teatro, partilharam-se vivências, experiências e afetos, num processo de criação coletiva que promoveu a escuta, a empatia e o ato de cuidar como gestos humanos e artísticos.
Paralelamente à criação teatral, o projeto promove as “Conversas no Bairro”, nos empreendimentos de Mataduços e Coradeiras, na freguesia de Fermentões, abrangendo um total de 158 famílias. São encontros informais e abertos à comunidade que convidam à reflexão sobre o Cuidar — de nós, dos outros e de tudo o que nos rodeia.
Em cada território, as experiências foram desenhadas a partir das suas especificidades: em Mataduços, o foco esteve no cultivo da terra e no respeito pelo que ela produz; em Coradeiras, o tema central foi a relação entre humanos e animais. Nestes momentos de diálogo participaram especialistas em saúde mental, nutrição e cuidado animal, que ajudaram a ampliar o debate e a traduzir o cuidado em ações concretas no quotidiano.
Para além de um projeto artístico, o COMvivência(s) é uma experiência social e afetiva: demonstra que, quando se cria espaço para o diálogo e a criação conjunta, os encontros improváveis tornam-se possíveis e transformadores.
O COMvivência(s) integra a 3ª edição do programa PARTIS & Art for Change, financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian e pela Fundação “La Caixa”. Conta com a parceria da CASFIG, da Escola de Medicina da Universidade do Minho, da Cruz Vermelha Portuguesa, da Casa do Povo de Fermentões, do Centro de Estudos Humanísticos da Universidade do Minho e da Rádio Universitária do Minho.
Cremos que estes modelos de projeto, pela sua abrangência, são transformadores, porque pluralizam as aprendizagens, ligando as dimensões do conhecimento (fazer, pensar, descobrir) com a dimensão relacional (o autoconhecimento e valorização, a partilha de experiências com pessoas diferentes e o trabalho em equipa). Assim se melhora o mundo.
Carla Silva, CASFIG, EM – Coordenadora da área Social do Projeto
Manuela Ferreira, Associação Paisagem Periférica – Direção Artística do Projeto

