TRANSFERÊNCIA DE COMPETÊNCIAS NA ÁREA DA EDUCAÇÃO. LIMITES ÀS COMPETÊNCIAS DOS MUNICÍPIOS.

A Lei n.º 50/2018, de 16 de agosto, veio estabelecer o quadro de transferência de competências para as autarquias locais e entidades intermunicipais, concretizando, assim, os princípios da subsidiariedade, da descentralização administrativa e da autonomia do poder local.
No âmbito das novas competências das autarquias locais, o artigo 11.º dispõe, relativamente à educação, que, sem prejuízo do seu exercício no respeito das competências dos órgãos de gestão dos agrupamento de escolas e escolas não agrupadas, “[é] da competência dos órgãos municipais participar no planeamento, na gestão e na realização de investimentos relativos aos estabelecimentos públicos de educação e de ensino integrados na rede pública dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário, incluindo o profissional, nomeadamente na sua construção, equipamento e manutenção”.
De igual modo, compete aos órgãos municipais, no que se refere à rede pública de educação pré -escolar e de ensino básico e secundário, incluindo o ensino profissional:
a) Assegurar as refeições escolares e a gestão dos refeitórios escolares;
b) Apoiar as crianças e os alunos no domínio da ação social escolar;
c) Participar na gestão dos recursos educativos;
d) Participar na aquisição de bens e serviços relacionados com o funcionamento dos estabelecimentos e com as atividades educativas, de ensino e desportivas de âmbito escolar; e
e) Recrutar, selecionar e gerir o pessoal não docente inserido nas carreiras de assistente operacional e de assistente técnico.
São, ainda, transferidas as competências de garantia de alojamento aos alunos que frequentam o ensino básico e secundário, como alternativa ao transporte escolar, o asseguramento das atividades de enriquecimento curricular, em articulação com os agrupamentos de escolas, a promoção do cumprimento da escolaridade obrigatória e a participar na organização da segurança escolar.
Ora, a transferência das novas competências para os órgãos municipais na área da educação foi concretizada no Decreto-Lei n.º 21/2019, de 30 de janeiro, a qual operou ope legis em 31 de março de 2022, i. e., sem dependência de qualquer formalidade adicional, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 76.º.
Assim, é da competência dos órgãos municipais participar, em matéria de educação, no planeamento, na gestão e na realização de investimento, nos termos regulados neste diploma legal (n.º 1 do artigo 3.º), devendo o seu exercício respeitar:
a) O direito à igualdade de oportunidades de acesso e sucesso escolar;
b) O cumprimento do currículo e orientações pedagógicas nacionais;
c) A equidade territorial e a solidariedade intermunicipal e inter-regional no planeamento das ofertas educativas e formativas e na afetação dos recursos públicos, no quadro da correção de desigualdades e assimetrias locais e regionais;
d) O respeito pela autonomia curricular e pedagógica dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas;
e) A salvaguarda da autonomia pedagógica no exercício da atividade docente;
f) A gestão pública da rede de estabelecimentos públicos de ensino, existentes ou a criar, através dos órgãos próprios dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas (artigo 4.º).
Quanto aos edifícios escolares, a construção, requalificação e modernização compete às câmaras municipais, em execução do planeamento definido pela carta educativa respetiva (artigo 31.º), assim como, a realização de intervenções de conservação, manutenção e pequenas reparações em estabelecimentos da educação pré-escolar e de ensino básico e secundário e a conservação e manutenção dos espaços exteriores incluídos no perímetro dos estabelecimentos educativos destas tipologias, cf. n.ºs 3 e 4 do artigo 32.º.
No que se refere ao seu funcionamento, o artigo 46.º determina que a contratação de fornecimentos e serviços externos essenciais ao normal funcionamento dos estabelecimentos educativos, designadamente eletricidade, combustível, água, outros fluidos e comunicações, compete aos municípios.
Estabelece, ainda, este diploma legal, nos n.ºs 1 e 2 do artigo 32.º, que é da competência da câmara municipal a aquisição de equipamento básico, mobiliário, material didático e equipamentos desportivos, laboratoriais, musicais e tecnológicos, utilizados para a realização das atividades educativas, cujas caraterísticas e especificações técnicas devem obedecer aos termos de referência fixados, em conformidade com a lei, pelo departamento governamental com competência na matéria.
Importa ter presente que os edifícios escolares que pertencem ao Parque Escolar, E.P.E., não são enquadráveis nas competências dos órgãos municipais previstas no n.º 1 do artigo 11.º da Lei n.º 59/2018 e no artigo 31.º e nos n.ºs 3 e 4 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 21/2019, sendo a única competência do município, relativamente a estes edifícios, a de contratação de fornecimentos e serviços externos essenciais ao seu normal funcionamento, designadamente eletricidade, combustível, água, outros fluidos e comunicações, cf. artigo 46.º do Decreto-Lei n.º 21/2019.
Não podemos negar que, embora a Lei n.º 50/2018 determine que uma das novas competências dos órgãos municipais é de participar na aquisição de bens e serviços relacionados com o funcionamento dos estabelecimentos e com as atividades educativas, de ensino e desportivas de âmbito escolar, no que se refere à rede pública de educação pré-escolar e de ensino básico e secundário, incluindo o ensino profissional, certo é que aquando da concretização da transferência de competências pelo Decreto-Lei n.º 21/2019, apenas foi contemplada a aquisição de equipamento básico, mobiliário, material didático e equipamentos desportivos, laboratoriais, musicais e tecnológicos, utilizados para a realização das atividades educativas – cf. n.º 1 do artigo 32.º, não o arrendamento de instalações e o aluguer de equipamentos.
Tanto assim é que a Portaria n.º 10/2023, de 4 de janeiro, que determina a fórmula de cálculo das transferências financeiras do Fundo de Financiamento da Descentralização para o exercício, pelos órgãos das autarquias locais, da competência relativa ao financiamento das despesas com a aquisição de equipamentos utilizados para a realização das atividades educativas, apenas faz referência à transferência financeira para a aquisição dos equipamentos a que se refere o n.º 1 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 21/2019.
Pelo que, quando esteja em causa a necessidade de arrendamento de um espaço e aluguer de equipamentos para o desenvolvimento da componente prática de um curso profissional, não subsiste qualquer dúvida que a aquisição de bens e serviços em causa não se enquadra nas competências transferidas para os órgãos municipais no domínio da educação.
Luísa Caldeira Pinto
Técnica Superior do Departamento Jurídico