JURISPRUDÊNCIA

RECURSOS HUMANOS
SIADAP 2017. Reclamação ato homologação – natureza facultativa. Inimpugnabilidade do ato.
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 09/06/2022 - Processo n.º 01106/19.8BEAVR
Sumaria o acórdão o seguinte:
1. A reclamação do ato homologatório não tem natureza necessária, mas meramente facultativa e, nesse sentido, em abstrato, o ato final praticado pela administração no procedimento não seria a decisão proferida sobre a reclamação, mas antes o ato homologatório da avaliação, dado que o recurso à via contenciosa é possível logo que proferido o despacho de homologação.
2. A partir da entrada em vigor do atual CPA, a reclamação, prevista no art.º 72.º da Lei n.º 66-B/2007, de 28 de Dezembro, assume natureza facultativa.
CONTRATAÇÃO PÚBLICA
Ajuste direto. Execução do contrato. Efeitos retroativos. Nulidade. Recusa de visto.
Acórdão do Tribunal de Contas n.º 20/2022, de 07/06/2022, Proc. n.º 0422/2022
Acordam os Juízes do Tribunal de Contas, em Subseção da 1.ª Seção que:
“1. O recurso ao ajuste direto e a não redução a escrito de um contrato público suscita, desde logo, o questionamento da sua validade, isto por não terem sido observadas as respetivas normas procedimentais aplicáveis, podendo a situação em apreço ser qualificada como não mais do que uma aquisição direta.
(…)
6. Ou seja, à data em que foi aberto o procedimento que conduziu ao ajuste direto, dos doze meses de execução do contrato já tinham decorrido nove.
7. Esta situação faz concluir, do mesmo modo, que aquilo a que a entidade adjudicante procedeu não foi a um ajuste direto, mas sim a uma verdadeira aquisição direta, semelhante à situação analisada por este mesmo TdC nos acórdãos n.ºs 8/2015, de 30 de junho – 1.ª S/SS, e 26/2018, de 22 de maio – 1.ª S/SS: uma situação de contratação com ausência total de procedimento, que posteriormente se tenta colmatar com um procedimento conducente a um contrato com efeitos retroativos.
8. Como vimos, é este precisamente o caso aqui em apreço, por duas ordens de razões:
- a entidade requerente omitiu totalmente o procedimento, tentando posteriormente colmatar tal omissão com um contrato com efeitos retroativos; e
- o procedimento de ajuste direto posteriormente adotado pela requerente foi-o num caso em que não se mostravam reunidos os pressupostos exigidos pela lei para tal.
9. Assim, encontra-se o contrato aqui em apreço ferido por nulidade nos termos do disposto no Art.º 284.º, n.º 2, do CCP, por remissão para o art.º 161.º, n.º 2, alínea l) do Código de Procedimento Administrativo.
10. Sucede ainda que em momento algum do procedimento que antecedeu a celebração deste contrato proferiu a entidade adjudicante um ato que fundamentasse a decisão de não reduzir o contrato a escrito.
11. Não se encontra nas peças que constituem este processo um tal ato de decisão de dispensa da redução a escrito do contrato submetido a fiscalização prévia e no qual se exponham os motivos que estivessem na base de tal decisão.
12. Ou seja, também aqui o contrato celebrado se mostra inquinado, por violação do disposto no Art.º 94.º do CCP, na medida em que não demonstrou a requerente que cairia no âmbito de aplicação das exceções consagradas no Art.º 95.º do mesmo Código.
13. Mais se constata, ainda, que a entidade fiscalizada não apresentou a documentação financeira de suporte dos encargos do presente contrato, nomeadamente os comprovativos extraídos do sistema informático de apoio à execução orçamental do registo dos compromissos, com evidência da respetiva numeração e data de registo, assim como o mapa de fundos disponíveis, extraído do sistema informático, que tivesse suportado a inscrição dos compromissos em causa.
14. Efetivamente, a ausência de demonstração da documentação financeira de suporte dos encargos dos presentes contratos, nomeadamente, a ausência de cabimentos e de compromissos válidos à data da assunção dos diferentes encargos contratualizados, implica a violação de normas financeiras, eventualmente suscetíveis de constituírem fundamento da recusa de visto, à luz da alínea b) do n.º 3 do Art.º 44.º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas (LOPTC), estando, nomeadamente em causa o incumprimento do n.º 3 do Art.º 52.º da Lei n.º 151/2015, de 11 de setembro, aplicável nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 73/2013, de 03 de setembro e dos artigos 5.º da LCPA, 7.º do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21.06, nos termos dos quais nenhum compromisso gerador de despesa pública pode ser assumido sem prévia verificação do cabimento orçamental e da existência de disponibilidades para lhe fazer face.
15. Por força do disposto no nº 2 do Art.º 4º da Lei nº 73/2013, de 3 de setembro e Art.º 59º, nº 2, alínea c) da Lei nº 75/2013, de 12 de setembro, as deliberações que determinem ou autorizem a realização de despesas não permitidas por lei são nulas.
16. As nulidades contratuais verificadas são fundamento absoluto de recusa de visto, que não permite a sua concessão ainda que acompanhada de eventuais recomendações, atento o disposto no Art.º 44.º, n.º 3, alíneas a) e b), e n.º 4 (este a contrario sensu), da LOPTC.
17. Por seu turno, a ausência de demonstração da documentação financeira de suporte dos encargos dos presentes contratos, nomeadamente, a ausência de cabimentos e de compromissos válidos à data da assunção dos diferentes encargos contratualizados (ponto III. 3 supra), implica a violação de normas financeiras, eventualmente suscetíveis de constituírem fundamento da recusa de visto, à luz da alínea b) do n.º 3 do Art.º 44.º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas (LOPTC).
18. Tendo em conta o relatado e apurado nos autos no que respeita a eventual responsabilidade sancionatória por incumprimento do prazo a que alude o n.º 2 do Art.º 81.º da LOPTC, há que determinar, nos termos conjugados dos Art.ºs 77.º, n.º 5, da LOPTC, e 130.º, n.ºs 2 e 3, do Regulamento deste TdC, o prosseguimento para apuramento dessa responsabilidade (cfr. Art.º 66.º, n.º 1, da LOPTC), com a elaboração da respetiva informação, nos termos do Art.º 133.º do mesmo Regulamento.”.
Contencioso Pré-Contratual. Empreitada de Obras Públicas. Plano de Trabalhos.
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 14/07/2022, Proc. n.º 0627/20.4BEAVR
Dispõe este acórdão que: “I – Da conjugação dos arts. 43º nº 4 b), 57º nº 2 b) e 361º nº 1 do Código dos Contratos Públicos não resulta a imposição, para todos os casos, de um nível único de detalhe do “plano de trabalhos” (e de pagamentos, de equipamentos e de mão-de-obra), a apresentar com as propostas em procedimentos de formação de contratos de empreitada de obras públicas, designadamente que exceda o necessário para assegurar o objetivo legal (“ratio legis”) de permitir um adequado controlo, por parte do dono da obra, da execução da empreitada concretamente em causa, tal como fixado quanto ao seu ritmo e sequência e meios utilizados.
II – Não se destinando o “plano de trabalhos” a garantir o compromisso da efetiva realização, por parte do empreiteiro, de todas as espécies de trabalho previstas, necessárias para a realização da obra – objetivo atingido através da declaração de aceitação, pelo empreiteiro, do conteúdo do Caderno de Encargos (e, portanto, da realização de todas as espécies de trabalho discriminadas, pelo dono da obra, no “projeto de execução” e no respetivo “mapa de quantidades”) -, nada impede que o “plano de trabalhos” possa agregar ou agrupar diversas espécies de trabalho, desde que permita, em concreto, controlar adequadamente o ritmo e a sequência da execução da empreitada, e os meios nela utilizados, e respeite as eventuais exigências do Caderno de Encargos (nomeadamente, quanto à unidade de tempo e periodicidade aí definidas pelo dono da obra).”.
Contencioso Pré-contratual. Conflito interesses. Princípio da igualdade. Princípio da concorrência.
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 31/08/2022, Proc. n.º 00664/21.1BEAVR
Sumaria o acórdão referido, quanto aos temas supra indicados, o seguinte: “1 . O conceito de conflito de interesses engloba, no mínimo, qualquer situação em que os membros de um prestador de serviços que age em nome da autoridade adjudicante, que participem na condução do procedimento de contratação ou que possam influenciar os resultados do mesmo, têm direta ou indiretamente um interesse financeiro, económico ou outro interesse pessoal suscetível de comprometer a sua imparcialidade e independência no contexto do procedimento de adjudicação.
2. A Administração Pública deve tratar de forma imparcial aqueles que com ela entrem em relação, designadamente, considerando com objetividade todos e apenas os interesses relevantes no contexto decisório e adotando as soluções organizatórias e procedimentais indispensáveis à preservação da isenção administrativa e à confiança nessa isenção.
3. Os princípios da igualdade e da concorrência devem assegurar iguais condições de acesso e de participação aos interessados em contratar, sendo que este último se destina a assegurar que, na formação dos contratos, deve ser garantido o mais amplo acesso ao procedimento por parte dos interessados em contratar e, também, contribuir para que o universo de concorrentes seja o maior possível e, por isso, se afasta o impedimento de participação sempre que não se demonstre uma efetiva ocorrência de uma situação de conflito de interesses.
4. Resultando da análise do processo de concurso público que ambos os concorrentes -A. e contra-interessada - obtiveram 100 % na análise da proposta no requisito qualidade, sendo o requisito diferencial apenas o do preço, não sendo este requisito tangível ou susceptível de ser adivinhado ou objecto de “informação privilegiada”, não se verifica conflito de interesses, indutor da violação dos princípios da igualdade e da concorrência.”.