JURISPRUDÊNCIA CONTRATAÇÃO PÚBLICA

Contratação pública. Concurso público. Prévia qualificação. Requisitos mínimos de capacidade técnica. Habilitações legais.
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 05/05/2022, Proc. n.º 1834/21.8BELSB
Acordam os juízes do Tribunal Central Administrativo Sul que “I - O ato impugnado, praticado num procedimento em que nos documentos conformadores do mesmo se previam disposições como as que foram questionadas nos autos, configura a aplicação daquelas, porquanto foi através deste que se materializaram os respetivos efeitos restritivos.
II - A exigência de estrita inscrição na Ordem dos Engenheiros, afastando a inscrição na Ordem dos Engenheiros Técnicos, não encontra razão aparente, nem foi invocada, no objeto do contrato, in casu, de aquisição de serviços para a elaboração do projeto para o novo Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada, nos Açores, e nem a mesma se revela proporcional, atendendo ao que resulta da Lei n.º 31/2009, de 03.07., designadamente, dos seus art.ºs 4.º, n.º 1, 6.º, n.º 1 e 10.º, n.º 3 e Quadro 2 do Anexo III deste diploma legal.
III - Nesta medida, considera-se desproporcional a aludida exigência face ao objeto do contrato em apreço e às tarefas que o mesmo importa, razão pela qual se conclui que a mesma viola o princípio da concorrência, da proporcionalidade e da não discriminação, pois que a Recorrida não apresentou qualquer justificação para a restrição operada por via das especificações fixadas nas peças do procedimento, estribando- se, essencialmente, na margem discricionária de que beneficia na respetiva fixação. O que, e face a todo o exposto, é pouco. (…)
V - O invocado imperativo da prevalência da Diretiva e dos princípios conformadores do Direito da União Europeia, assim como o CCP, apenas impõem limites a eventuais exigências de capacidade técnica e/ou financeira e a determinadas especificações técnicas, designadamente, a sua adequação ao necessário e desejável cumprimento do contrato a adjudicar e de que todos estes requisitos estejam ligados e sejam proporcionais com o seu objeto.
VI - Cumpridos estes limites, a entidade adjudicante pode conformar o procedimento com as exigências que considere necessárias, desde que cumpra também, no momento da determinação dos critérios de seleção, os princípios fundamentais da contratação pública enunciados no artigo 18.º, n.º 1, da Diretiva 2014/24, e no art.º 1.º-A, do CCP, tratando os operadores económicos de acordo com os princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação, bem como atuando de maneira transparente e proporcionada, assim se garantindo, designadamente, que a organização do contrato não tem o intuito de reduzir artificialmente a concorrência ou de favorecer ou desfavorecer indevidamente determinados operadores económicos.
VII - No caso, este desiderato deve ser alcançado com a repetição do procedimento e não através de uma interpretação conforme das peças do procedimento sub judice.”.
Contratação pública. Exclusão de proposta por preço anormalmente baixo.
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 05/05/2022, Proc. n.º 590/21.4BESNT
Estabelece o Tribunal Administrativo Sul que: “I - O art.º 71.º do CCP, na redação resultante do DL n.º 111-B/2017, de 31.8, não previa um critério legal supletivo e automático, como sucedeu na versão original do CCP de 2008 (40% ou 50% abaixo do preço base fixado, consoante se tratasse de contrato de empreitada de obras públicas ou de outro contrato), para o caso da entidade adjudicante não fixar nas peças do procedimento o valor a partir do qual a proposta de preço seria considerada anormalmente baixa.
II - O n.º 1 do preceito legal deixou na disponibilidade da entidade adjudicante, dentro da sua margem de livre decisão, a prévia fixação da concreta determinação do preço anormalmente baixo, designadamente, entre outros critérios considerados adequados, através da fixação de um desvio percentual em relação à média dos preços das propostas a admitir (e já não em relação ao preço base – versão de 2008 – ou por referência a preços médios obtidos em eventuais consultas preliminares ao mercado – revisão de 2021).
III - Quando tenha existido prévia fixação de um limiar de preço anormalmente baixo o mesmo é divulgado no programa do procedimento ou no convite – cfr art º 71.º, n.º 1.
IV – O art.º 71.º do CCP, saído da revisão de 2017, mesmo na ausência de fixação de um limiar de preço anormalmente baixo, não estabelecia qualquer proibição de a entidade adjudicante considerar determinada proposta como de preço anormalmente baixo.
V – Quando não tenha sido fixado um limiar de preço anormalmente baixo, mesmo na versão do CCP de 2017, a entidade adjudicante tem de proceder a uma apreciação casuística e discricionária do preço, socorrendo-se de todos os elementos carreados para o procedimento e dos princípios gerais de direito, e, na sua aferição, formular um juízo de anomalia sobre o valor da proposta e exclui-la do procedimento, ao abrigo do art.º 70.º, n.º 2, al e) do CCP, se concluir que o preço é anómalo.”.
Contratação pública. Concurso público. Serviços de vigilância e segurança humana. Exclusão da proposta.
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 29/04/2022, Proc. n.º 00339/21.1BECBR
Quanto ao tema supra, sintetizou este acórdão que: “1. Da conjugação do disposto no n.º 2 do artigo 1.º-A, e na alínea e) do artigo 70º do Código dos Contratos Públicos que o incumprimento de normas laborais, patente numa proposta, é fundamento legal, imperativo, para a exclusão da sua proposta num concurso da aquisição de serviços de vigilância e segurança humana.
2. Incumprimento da lei laboral que não poderia ser superado em sede de esclarecimentos porque tal se traduziria, no caso, numa proposta substancialmente diversa, sendo certo que o valor da proposta era um factor decisivo e essencial no concurso – n.º 2 do artigo 72.º do Código de Contratos Públicos.
3. Não se pode invocar aqui o princípio basilar da concorrência nos concursos públicos porque este apenas permite admitir o maior leque possível de propostas que possam ser consideradas legais.
4. Por o preço proposto só ter sido possível pelo incumprimento de normas laborais, caso contrário seria mais alto, deverá considerar-se “preço anormalmente baixo” nos termos e para os efeitos do disposto na alínea e) do artigo 70.º do Código dos Contratos Públicos.
5. A possibilidade de obter um auxílio de Estado não serve para afastar a imperatividade, neste caso, da exclusão desta proposta face ao disposto alínea e) do n.º 4 do artigo 71.º do Código de Contratos Públicos.
6. Sendo os apoios ou incentivos ao emprego no caso, para além de meramente hipotéticos, incompatíveis com a obrigação constante da cláusula 12.3 das condições gerais do caderno de encargos, e que resulta do artigo 285.º, n.ºs 1,2 e 10 do Código de Trabalho, a de manter os trabalhadores ao serviço no mesmo posto, não havia justificação legal para não excluir a proposta e apreço.
7. Constando do programa do concurso a exigência de a apresentação, enquanto documento da proposta, de uma “memória descritiva respeitante aos preços mensais por instalação, que inclui no mínimo: número de horas/mês por tipologia (diurna, nocturna, dias úteis, sábados, domingos e feriados) e custo unitário de vigilante/hora por tipologia (diurna, nocturna, dias úteis, sábados, domingos e feriados)” é motivo de exclusão a apresentação de um documento em que não discrimina, em concreto, o trabalho prestado em dias úteis e ao fim-de-semana, englobando tudo no mesmo preço/hora, nos termos das disposições combinadas do artigos 57.º, n.º1, alínea c), e 70.º, n.º 2, al. a) do Código dos Contratos Públicos, pois tal equivale à não apresentação do documento exigido no programa do concurso, dado ser essencial essa discriminação, para verificação do cumprimento ou não, das obrigações laborais.”.
Contratação pública. Assinatura eletrónica qualificada. Procuração. Exclusão de proposta.
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 13/05/2022, Proc. n.º 01637/21.0BEPRT
Os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordaram em negar provimento ao recurso, com o seguinte fundamento: “1. O argumento de que uma procuração passada com a menção de conferir poderes ao mandatário para submeter propostas e assinar documentos, em nome do mandante, lhe confere poderes para vincular a empresa representada às propostas apresentadas pelo mandatário vale para os documentos físicos.
2. Não vale para os documentos eletrónicos, os quais, nos termos do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 02.08, (alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 62/2003, de 03.04, 165/2004, de 07.06 116-A/2006, de 16.0, e 88/2009, de 09.04, e Decreto-Lei n.º 12/2021, de 09.02), podem conter (I) a «assinatura electrónica»; (II)a «assinatura electrónica avançada» e (III) a «assinatura electrónica qualificada», como se refere na decisão recorrida.
3. Não vale como procuração que vincule o mandante às propostas apresentadas pelo mandatário aquela que refere indistintamente os poderes necessários para o seu representante assinar documentos, sendo que a assinatura eletrónica qualificada, exigida nos termos do concurso, é mais exigente do que a simples assinatura eletrónica.
4. Por outro lado, sendo os documentos da proposta assinados com assinatura eletrónica qualificada por um dos representantes da empresa e não por outro e sendo a procuração subscrita nos mesmos termos por ambos os representantes, não se percebe o sentido e alcance desta diferente forma de vinculação da empresa, por parte de dois dos seus representantes, o que permite, ficar com a dúvida justificada quanto ao verdadeiro alcance da vontade do representado e, por conseguinte, sobre se a expressão usada permite concluir pela abrangência da apresentação de propostas contratuais e, por conseguinte, se terá pretendido autorizá-lo expressamente a apresentá-las, em seu nome – e assim, a assinar os respectivos documentos constitutivos – em todos os procedimentos de contratação que se desenrolem sobre plataformas electrónicas, comprometendo neles, na fase pré-contratual, a sua representada, dúvidas que não se compadecem com o rigor exigido na verificação dos poderes do representante para submeter a proposta.
5. O que justifica a exclusão desta proposta, contida no acto impugnado, nos termos das disposições conjugadas dos artigos ao incumprimento do disposto no nº 4 do artigo 57.º e do artigo 146º, n.º2, als. d) e e) do Código de Contratos Públicos.”.